12/04/2014 08h26 - Atualizado em 12/04/2014 10h38

Pesquisadores da Ufal transformam resíduos tóxicos em biocombustível

Pesquisa usa líquido proveniente da fabricação da farinha de mandioca.
Material é coletado no interior e depois processado em laboratório.

Carolina SanchesDo G1 AL

Reator transforma manipueira em hidrogênio. (Foto: Carolina Sanches/G1)Reator transforma manipueira em hidrogênio.
(Foto: Carolina Sanches/G1)

Um projeto de pesquisa desenvolvido no curso de Engenharia Ambiental da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) encontrou uma maneira de evitar que a manipueira - resíduo líquido, de cor amarela, que sai da mandioca após ela ser prensada durante a fabricação da farinha - seja descartado no meio ambiente. O resíduo, altamente poluente devido à carga orgânica e bastante tóxico à natureza, vem sendo usado para a fabricação de energia renovável.

A cada tonelada de raiz processada é gerada, em média, 300 a 600 litros do resíduo. Sem solução a baixo custo, os produtores acabam burlando as leis ambientais e descartam a manipueira em rios e terrenos próximos.

Agora, a pesquisa “Produção de hidrogênio e metano a partir de resíduos agroindustriais gerados no estado de Alagoas visando a redução de impactos ambientais”, pretende mudar essa realidade. O projeto é coordenado pelo professor Eduardo Lucena e conta com um grupo de estudantes de gradução do curso de engenharia e duas alunas de mestrado.

“Este é o primeiro trabalho na área em Alagoas. A proposta é mostrar formas de reutilizar o resíduo para transformá-lo em hidrogênio, que não é poluente e é considerado o gás do futuro. Nossa produção é em pequena escala, mas serve como base para empresas que desejam investir na produção sustentável”, explicou o professor.

Segundo Lucena, é feito o tratamento da manipueira para reduzir a carga orgânica. “Além disso, ao contrário dos combustíveis fósseis, que na sua queima contribuem com o efeito estufa, o hidrogênio é uma fonte de energia limpa, pois só produz energia elétrica e vapor d’água”, disse.

Parte do trabalho é financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o que possibilitou a aquisição de material de pesquisa e equipamentos considerados de última geração na área. Após a coleta de material em campo, ele é manipulado no laboratório do Centro de Tecnologia (CTec) da Ufal.

Reaproveitamento
O professor Eduardo Lucena trabalha há anos com pesquisas buscando a produção de hidrogênio. O projeto com a manipueira começou em 2010. A proposta é pegar o resíduo não tratado e transformá-lo em um gás que pode alimentar até a casa de farinha. Excluindo, neste caso, o uso de madeira para os fornos à lenha, método utilizado atualmente para secar farinha.

Professor mostra um dos reatores de laboratório. (Foto: Carolina Sanches/G1)Professor mostra um dos reatores do laboratório.
(Foto: Carolina Sanches/G1)

“O hidrogênio na natureza gera bem menos poluentes, porque o vapor dele se transforma em água e energia elétrica. E esse método de reaproveitamento é o mais eficiente e barato. O hidrogênio também pode ser feito através de um outro processo, o de eletrólise, mas é mais caro”, avalia Lucena.

O professor explica que o grupo de pesquisa vai até as casas de farinha, faz a coleta da matéria prima e leva para o laboratório. Lá, o líquido é colocado em dois reatores biológicos que funcionam em temperatura ambiente, bombeando a manipueira de um para o outro de forma contínua. O primeiro produz o hidrogênio e o segundo produz o metano.

Para a produção de hidrogênio, a manipueira é colocada em um reator de acrílico com argila. Os micro-organismos dela funcionam como um filtro, que retém a carga orgânica da manipueira, transformando-a no elemento químico que pode ser usado para a produção de energia elétrica ou ainda etanol, que serviria como biocombustível. O líquido, então, é levado para um segundo reator, desta vez com cascas de sururu. A manipulação da manipueira nesta fase produz gás metano, que também pode ser usado como biocombustível.

"Só então o resíduo, agora com menos carga orgânica, pode ser descartado na natureza. Quando se fala em agressão ao meio ambiente, tem que se ter em mente a carga orgânica desse elemento. Quanto maior, mais poluente", alerta o professor.

Material da pesquisa é coletado em casas de farinha. (Foto: Divulgação)Material da pesquisa é coletado em casas de
farinha. (Foto: Divulgação)

A produção de energia a partir de resíduos não é uma proposta nova, e a utilização de reatores sem oxigênio (anaeróbios) também já foi testada. “Esta combinação de reatores anaeróbios com este tipo de substância [a manipueira] é uma técnica inédita no mundo e produzida apenas em alguns centros de pesquisa do Brasil”, falou Lucena.

Expansão
A proposta do grupo de pesquisa é fundamentar a tecnologia e expandir para o mercado não só usando a manipueira, mas outros resíduos. Atualmente, eles fazem análises em dejetos da suinocultura. “Este trabalho é à base de esterco de porco convenientemente diluído e aclimatado, obtido de uma fazenda de pequeno porte no interior”, explicou o professor.

Lucena diz que, em breve, eles irão utilizar a mesma técnica com outros resíduos das indústrias igualmente poluentes ao meio ambiente, como a vinhaça que sobra na fabricação do álcool, ou os restos da produção de leite de coco.

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