Por Roberta Cólen, Cau Rodrigues e Andréa Resende, G1 AL


— Foto: Arte G1

Após um ano de investigações das 39 mortes violentas registradas em Alagoas entre 21 e 27 de agosto de 2017, monitoradas pelo G1 no projeto Monitor da Violência, 46% dos casos ainda seguem com inquéritos em aberto.

  • Casos concluídos: 21
  • Casos em andamento: 18
  • Autores identificados: 17
  • Prisões: 12

O levantamento faz parte do Monitor da Violência, uma parceria do G1 com o Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Jornalistas do G1 espalhados pelo país solicitaram os dados via Lei de Acesso à Informação e também diretamente a delegados e ao Judiciário.

ANÁLISE DO FBSP: Produzindo impunidade

A Polícia Civil de Alagoas concluiu e remeteu à Justiça inquéritos de pouco mais da metade dos casos, mas só 2 chegaram à fase final do processo: um suicídio e uma morte por intervenção policial. Os outros ainda aguardam julgamento ou não há informação porque tramitam em segredo de Justiça.

Para entender um pouco sobre a dinâmica da investigação e os possíveis motivos pelos quais muitos inquéritos ainda não foram finalizados, a reportagem entrevistou o coordenador da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), delegado Eduardo Mero.

Ele ressalta que somente avaliando caso a caso seria possível explicar o motivo de haver inquéritos ainda em andamento, mas que, de uma maneira geral, o medo das testemunhas por causa da relação do tráfico de drogas com a maioria dos crimes é o principal entrave no curso da investigação.

“A dificuldade gera por conta disso, o medo de represálias por parte das testemunhas e familiares das vítimas. Então, é muito comum as pessoas serem ouvidas e afirmarem que não sabem de nada, mesmo sabendo, com medo de falar algo e depois ser vítima de algum crime”, disse Mero.

Coord. da Delegacia de Homicídios explica andamento das investigações de mortes violentas

Coord. da Delegacia de Homicídios explica andamento das investigações de mortes violentas

365 dias sem respostas

Uma investigação não é só feita de provas físicas, também é preciso coletar informações, histórias reais que ajudam a segurança pública a descobrir o motivo e o autor de um crime. E mesmo assim, às vezes isso não é suficiente.

Na investigação da morte de Marcos Daniel Ferreira Silva, a polícia concluiu o inquérito ainda em 2017, com indicação da autoria do crime, mas o Ministério Público do Estado de Alagoas (MP-AL) o devolveu em janeiro deste ano pedindo novas diligências. O caso segue em aberto na delegacia.

Marcos Daniel Ferreira Silva foi morto dentro da sua lanchonete; família acredita em execução — Foto: Arquivo pessoal

Outro caso sem solução é o de Keith Evelin Pereira Alves de Araújo Lago. A investigação aponta que ela se jogou da ponte do Vale do Reginaldo, em Maceió, mas o inquérito ainda não foi concluído.

As investigações começaram no 4º Distrito Policial, mas depois foram encaminhadas para o 9º DP, que informou ao G1 que o inquérito está quase concluído, faltando apenas o relatório final (documento com os elementos da investigação).

“Suicídio não é crime. É apurado porque, a depender a investigação, pode identificar a participação de um terceiro, auxiliando, instigando ou induzindo e também pode se tratar de um homicídio. A questão da dificuldade nessa investigação creio que segue a mesma lógica dos demais crimes, de não conseguir obter elementos necessários, ou que aguarda algum laudo para poder afirmar que foi suicídio”, explicou o coordenador da Homicídios.

Também há casos em que a investigação foi concluída e os suspeitos foram presos, mas que ainda não foram completamente solucionados. Assim como o inquérito da morte de Pedro Henrique dos Santos, adolescente baleado em Arapiraca, que foi remetido à Justiça com o indiciamento de Samuel Dominyn Santana e Samuel Felipe Soares de Oliveira Silva.

No dia 23 de agosto de 2018, os suspeitos foram submetidos a uma audiência de instrução no Fórum de Arapiraca, para que o juiz pudesse ouvir as partes e decidir se eles vão a júri popular. A audiência terminou sem definição.

Contudo, dias depois, a Promotoria alegou que não havia nos autos indícios suficientes de que eles eram os autores do crime. Com isso, a Justiça expediu alvarás de soltura para os dois. O caso ainda não foi encerrado porque a Defesa ainda não apresentou as suas alegações.

Audiência de instrução sobre morte de Pedro Henrique dos Santos aconteceu em agosto de 2018, no Fórum de Arapiraca, Agreste de Alagoas — Foto: Giovanni Luiz/TV Gazeta

Tráfico de drogas x assassinatos

Para o titular da Secretaria de Segurança Pública de Alagoas, coronel Lima Júnior, não há dúvidas que o tráfico de drogas é o maior responsável pelos assassinatos no estado.

"Quem mais mata no estado e no país são pessoas ligadas ao tráfico de drogas e as organizações criminosas, que têm por cima um grande manto da facção criminosa", falou Lima Júnior em entrevista para o Monitor da Violência em março deste ano.

O coordenador da Homicídios, Eduardo Mero, pondera que, mesmo sob influência do tráfico, parte das vítimas não tinha necessariamente ligação com crimes.

“Quando a gente fala 'relacionado ao tráfico', são vários fatores. Não é só apenas sobre aquele que tem passagem ou aquele que trafica a droga. Pode ser disputa de território por facções ou simpatizantes, que acreditam que determinada pessoa pertença a outra facção e por isso matam e, às vezes, essa pessoa nem tem envolvimento com a droga", disse Mero.

Também em entrevista ao G1 para o Monitor da Violência, Emerson Oliveira do Nascimento, professor de ciências políticas da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), avalia que os perfis da vítima e dos criminosos são parecidos.

"Em números gerais são negros, pobres, pouco escolarizados e da periferia da cidade, matando jovens com perfil semelhante. Então, está relacionado muito mais ao fenômeno da desorganização social e da ausência de planejamento urbano, ausência de políticas e atuação de gestão, do que necessariamente de uma cultura de violência", falou o professor.

Para o especialista, embora o policiamento ostensivo apresente resultados imediatos, ele não pode ser a única solução no combate à criminalidade.

"O que seria mais interessante era investir em políticas de prevenção, só que isso prescinde de uma transformação cognitiva na cabeça dos gestores, de acreditar que prevenção é mais eficiente, é mais barata, tem resultados muito mais sólidos ao longo do tempo do que políticas de repressão", afirma o especialista.

Especialista avalia o cenário de homicídios e possíveis soluções em Alagoas

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