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Faltou autocrítica na gestão Valéria: o quê tem a dizer o presidente da Adufal, que viu a vitória e a derrota da esquerda na Ufal?

Jailton de Souza Lira, 42, assistiu, no comando da Associação dos Docentes da Ufal (Adufal)- o sindicato dos professores da universidade- a derrota da reitora Valéria Correia, candidata à reeleição, na Ufal.

Algo inusitado porque Valéria foi apoiada por partidos de esquerda em 2015, quando chegou ao ponto mais alto na disputa por cargos na maior universidade pública alagoana. Desde a redemocratização que os reitores mais à direita comandaram a universidade.

A ruptura prometia sacudir a universidade. Isso não aconteceu.

O quê, afinal, derrotou a reitora?

Jailton fala sobre este assunto, a postura da equipe da reitora e os efeitos da era Bolsonaro no futuro das universidades. Ele disputa a reeleição na presidência da Adufal. Vai enfrentar Tiago Zurck, da equipe da Valéria.

Jailton é professor do Centro de Educação (UFAL). Tem Doutorado em Educação. Atual presidente da Associação dos Docentes da UFAL (gestão 2017-2019). Ex- presidente do Conselho Municipal de Educação. Foi dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas e da Central Única dos Trabalhadores.

A oposição disse que a atual direção da Adufal foi responsável pela derrota da reitora Valéria Correia na Ufal. Gostaria que o senhor comentasse essa declaração.

Esta afirmação não condiz com a realidade. O papel das entidades sindicais Adufal (Associação dos Docentes da UFAL), Sintufal (Sindicato dos Trabalhadores da UFAL) e do DCE (Diretório Central dos Estudantes) foi o de organizar a consulta eleitoral para a reitoria.

Os candidatos à gestão da UFAL tiveram o direito de apresentar suas propostas, bem como prestar contas das suas atividades acadêmicas ou administrativas realizadas no âmbito da instituição.

Coube à comunidade acadêmica comparar estas candidaturas, e fazer a sua escolha de maneira livre e democrática. No tocante à candidatura do atual grupo dirigente, naturalmente, também foi feito um balanço da própria gestão, ocasionando o resultado conhecido.

Seria ideal que o grupo político que comanda a Universidade nesses últimos quatro anos fizesse uma análise mais rigorosa sobre o seu próprio trabalho, o que demonstraria alguma capacidade de autocrítica.

Essa incapacidade de autocrítica (demonstrada ao longo dos quatro anos de gestão) é algo que precisa ser considerado como um elemento importante para compreensão dos resultados da recente consulta para reitoria, sob pena de se continuar repetindo os mesmos erros na administração da Universidade.

O pano de fundo dessa movimentação são as rubricas judiciais. Onde a reitora Valéria errou e acertou na gestão dela?

Especificamente sobre a questão da retirada das rubricas judiciais, é preciso posicionar esse debate adequadamente.

Desde sempre, procuramos manter um diálogo fraterno com a gestão da instituição, mas evidenciando que as entidades sindicais não iriam aceitar passivamente que os servidores perdessem esses direitos, incorporados aos seus salários há mais de vinte anos.

Desde sempre, oferecemos subsídios legais e nos colocamos à disposição para colaborar na busca de soluções para a questão.

Quando a reitoria decidiu, de maneira unilateral, pela retirada desses pagamentos, cerca de 1.000 servidores foram prejudicados.

Neste percurso, é importante dizer, todas as ações do sindicato foram discutidas amplamente nas assembleias que realizamos com a categoria, desde as tentativas de negociação infrutíferas às ações político-sindicais e jurídicas.

Os que desconhecem esse fato certamente não compareceram às assembleias unificadas das categorias que deliberaram sobre este tema, e que reuniram centenas de servidores.

As defesas administrativas interpostas pelos servidores foram inteiramente desconsideradas pela gestão da UFAL, atropelando argumentos, prazos e cálculos que deveriam ter sido realizados de maneira individualizada. É preciso deixar claro também que nesse processo, os sindicatos Adufal e Sintufal lograram êxito em seguidas ações judiciais no sentido de manutenção do pagamento dessas conquistas, todas estas desrespeitadas pela gestão da Universidade em uma ação deliberada de postergação do cumprimento das liminares, enquanto a Procuradoria Federal recorria destas decisões.

Fechamento antecipado da folha de pagamento, pareceres de força executória que nunca chegavam ao departamento de pessoal, pretextos que impediam a inclusão das informações no sistema, foram diversas as maneiras utilizadas pela administração da instituição para não cumprir as liminares concedidas em favor dos trabalhadores.

Vale lembrar que nesse mesmo período outras liminares judiciais também foram descumpridas pela gestão.

Finalmente, na data de 15 de março, quando se findava novo prazo de devolução dos pagamentos aos servidores determinados pela justiça, houve, na véspera, novo requerimento feito pelos sindicatos em juízo, exigindo novamente o cumprimento da liminar em vigor.

Mas saliento o seguinte: o requerimento das entidades foi o pagamento das rubricas judiciais e não a prisão de qualquer pessoa; isso nunca foi o nosso objetivo.

Contudo, o que a gestão da Universidade fez em seguida? Difundiu amplamente que os sindicatos haviam solicitado a prisão dos gestores, pura e simplesmente, provocando uma comoção popular, se utilizando desse fato com vistas à obtenção de dividendos políticos, conforme acompanhamos.

O fato é que esses valores acabaram não sendo repostos nos salários daquele mês, e mesmo após a decisão do Conselho Universitário pela anulação de todos aqueles processos administrativos que sequer respeitaram o direito à ampla defesa e ao contraditório, os servidores se viram sem esses direitos assegurados, causando todo tipo de problemas financeiros e de saúde a estas pessoas.

Esta é a situação em que nos encontramos nesse momento em relação a esse assunto, no qual os reais perdedores foram os professores e técnico-administrativos da Universidade.

Outra questão que é preciso deixar clara: o fato de algum gestor se autodenominar de esquerda ou direita não muda em nada as suas responsabilidades administrativas e o respeito ao Estado de Direito.

Ainda que tenhamos um modelo judicial de natureza burguesa que raramente favorece os trabalhadores, as determinações judiciais devem ser cumpridas, especialmente quando essas determinações são favoráveis aos trabalhadores, como nesse caso específico.

A gestão da instituição, independente do grupo dirigente do momento, representa o Estado, enquanto o sindicato representa os seus associados.

Existem, portanto, campos de atuação distintos, onde cada instituição precisa cumprir o seu papel.

Claro que a direção da Adufal gostaria que essas questões não tivessem chegado a tais extremos (as prováveis repercussões das eventuais ações judiciais foram amplamente discutidas nas assembleias; as assessorias jurídicas sindicais alertaram frequentemente sobre os riscos). Contudo, não foram os sindicatos que romperam o diálogo com a gestão da Universidade, conforme explicitei anteriormente.

Em relação a eventuais acertos e erros da gestão atual da Universidade, reafirmando o que disse antes, a comunidade acadêmica já fez sua avaliação no momento oportuno.

Como presidente do sindicato não é necessário que eu opine sobre essa questão.

Nossas divergências públicas em relação à atual administração da instituição se deram exclusivamente nas questões relativas aos direitos dos servidores; a direção da Adufal nunca fez qualquer menção a outros aspectos fora da sua área de atuação sindical.

Provavelmente, o relacionamento institucional entre sindicato e Universidade teria sido mais tranquilo se a gestão tivesse procurando o diálogo ao invés do enfrentamento.

O Consuni vai eleger o próximo reitor da Ufal. Josealdo Tonholo foi o mais votado pela comunidade acadêmica. Qual o resultado que a Adufal espera? Se o resultado for diferente dessa espera, o que o sindicato fará?

A nossa preocupação maior é com a manutenção do pacto democrático que esteve em vigor até aqui nos processos de escolha e nomeação dos reitores das IFEs; com o respeito à vontade da maioria, em última palavra, com o respeito à autonomia da Universidade.

O fato de estarmos vivendo o receio de ruptura desse pacto, com a possibilidade de termos à frente da UFAL não o gestor eleito, mas alguém que não teve o respaldo da maioria ou mesmo um interventor externo à UFAL, é uma demonstração dos tempos sombrios que foram inaugurados com o mandato do senhor Jair Bolsonaro.

Estamos atentos com o que está acontecendo em outras Universidades.

Penso que a defesa da nossa autonomia e da Democracia precisa ser elemento que unifique a nossa luta, para além de qualquer divergência interna no âmbito da Universidade.

O Andes diz que o “Governo Bolsonaro trata universidades como inimigas”. Qual a opinião sobre a atual política do Ministério da Educação?

O governo federal tem demonstrado que não tem outra meta para a educação brasileira, a não ser o desmonte e a desestruturação das políticas educacionais criadas desde a Constituição Federal de 1988, insistindo em uma pauta de cunho moralista e ideológico, escolhendo inimigos prioritários a cada momento, como os professores e estudantes e a classe trabalhadora de maneira mais ampla.

Apenas para citar um exemplo, veja o decreto que o Presidente publicou recentemente acerca da militarização das escolas, uma clara indução a um modelo de educação baseados em argumentos, no mínimo, questionáveis, que mascaram os reais problemas pelos quais passa a educação brasileira.

Esse discurso que aponta as instituições públicas e o conjunto dos servidores públicos como um fardo que a nação carrega já estava presente no Governo Temer e se fortalece no atual governo.

É a pauta do Banco Mundial sendo, mais uma vez, implementada pelo Estado, da qual faz parte a entrega do nosso patrimônio mineral ao capital e a privatização da educação e demais serviços públicos.

É preciso considerar também – porque esses elementos estão conectados – o que vem representando para as políticas sociais (em especial nas áreas de Saúde e Educação) a aprovação da EC 95 (antiga PEC da Morte); da Reforma Trabalhista e mais recentemente a Reforma da Previdência, que avança no Senado.

Temos a necessidade de estruturar adequadamente o sistema educacional; redimensionar o Fundeb para a Educação Básica; construir creches; ampliar vagas para a Educação Infantil; discutir um formato desejável para o Ensino Médio; garantir a sustentabilidade das Instituições de Ensino Superior (que está sendo ameaçada por propostas como o Future-se e com a política de contingenciamento e bloqueio das verbas das Universidades); ampliar as vagas para a pós-graduação; disponibilizar recursos suficientes para a pesquisa científica.

Tudo isso em um contexto absolutamente adverso, de um governo que despreza a Ciência e confunde Educação com doutrinação.

Por que a eleição para o comando da Adufal interessa de tucanos a petistas, passando pelo PSOL e PCB?

Desconheço que exista esse interesse tão acentuado.

Contudo, a livre atuação das agremiações partidárias faz parte da democracia.

Os partidos políticos defendem concepções de mundo e se orientam conforme os seus estatutos e eixos programáticos. Não vou criticar o papel dos partidos políticos nesse ponto (como fazem os oportunistas e aqueles que almejam a despolitização da sociedade), pois eles representam parcelas expressivas da sociedade. Saliento, porém, que nesse momento conturbado pela qual passamos, seria fundamental que os instrumentos de luta da classe trabalhadora se unificassem em torno da defesa dos direitos trabalhistas e sociais do conjunto da sociedade.

Nesse episódio das rubricas judiciais, por exemplo, cerca de 70% da base do sindicato foi prejudicada e não tivemos por parte de algumas agremiações políticas sequer uma nota de solidariedade; ao contrário, à época, o sindicato foi duramente atacado como se fosse crime lutar pelos direitos dos seus associados.

O que acho realmente estranho é o fato de integrantes da gestão da Universidade estarem se movimentando para composição de uma chapa para a eleição do sindicato com o argumento de que é necessário uma diretoria da Adufal independente e combativa(que, supostamente, apenas eles representariam).

Ora, uma chapa articulada por pessoas com cargos de gestão na reitoria se candidatar com base nesses princípios parece algo um tanto quanto contraditório, para dizer o mínimo.

Por outro lado, posso assegurar que, mesmo tendo cometido eventuais equívocos nesse percurso de dois anos de mandato à frente da Adufal, todo/as sabem o quanto nos empenhamos na defesa intransigente dos direitos dos/as sócios/as da entidade.

A esse respeito, acho importante enumerar alguns avanços importantes realizados na atual gestão do sindicato para que não pairem dúvidas sobre o trabalho que realizamos:

– Na questão patrimonial, fizemos a reforma e modernização da sede da entidade, com ampliação do mini-auditório, salas de reunião, vagas de estacionamento (pequena, mas até então inexistente); adquirimos um veículo próprio pela primeira vez na história da Adufal e estamos concluindo a posse da sede do sindicato no cartório de registro de imóveis, porque, apesar da entidade funcionar naquele imóvel há 40 anos, em razão de diversos obstáculos legais, a sede nunca esteve de fato em nome da entidade. Importante frisar: todas essas ações realizadas em sua grande parte com recursos próprios. Ainda assim, continuamos mantendo as contas da Adufal plenamente organizadas. Estas informações podem ser conferidas nas prestações de contas disponíveis no site da entidade;

– Na área da comunicação, aperfeiçoamos nossos contatos com a base sindical por meio das mídias e ferramentas tecnológicas disponíveis (todos/as os associados são informados praticamente em tempo real das ações do sindicato), um aspecto no qual, inegavelmente, avançamos muito;

– No aspecto cultural e de entretenimento, realizamos atividades de confraternização e atividades culturais com os sócios da entidade, como forma de possibilitar encontros entre amigos e colegas de trabalho, oferecendo um pouco de alegria e troca de afetos em meio a esse conjunto de ataques que estão se intensificando nos últimos anos contra a carreira docente. Menciono, por exemplo, as programações culturais do Café e Prosa e as festividades relativas às festas juninas e natalinas.

– Em termos de prestação de serviços, estamos celebrando uma série de convênios com diversos estabelecimentos comerciais, restaurantes, planos de saúde, clínicas médicas, farmácias, concessionárias de veículos, postos de combustíveis, escolas, que oferecem descontos aos associados da entidade quando da utilização destes serviços. Apesar de entendermos que a celebração destes convênios não deva ser o foco central do trabalho das entidades sindicais, parte significativa da base docente vinha reivindicando que a Adufal buscasse atuar nessa área, assim como a grande maioria dos sindicatos está fazendo. Começamos por Maceió em um primeiro momento; a próxima etapa é viabilizar parcerias semelhantes no interior do estado;

– Na relação com as entidades sindicais, estreitamos as ações da entidade especialmente com os sindicatos representantes dos trabalhadores da educação pública, a exemplo do Sinteal e do Sintietfal (e claro, com o Sintufal, com o qual a Adufal tem diversas bandeiras em comum), além do DCE e Centros Acadêmicos, da CUT e demais movimentos sociais. Isso possibilitou que a Adufal participasse das principais questões atuais da educação, como o debate sobre a Escola sem Partido; o Future-se; a defesa da autonomia universitária; a luta contra os cortes orçamentários; a defesa da democracia e dos Direitos Humanos; o combate ao assédio moral etc., realizando diversos seminários, mesas redondas e participando dos atos públicos referentes a estas questões. Ou seja, o papel do sindicato na mobilização da categoria no que diz respeito às questões centrais dos últimos anos é algo inegável até para os mais críticos;

– No campo jurídico, a assessoria atuou o tempo inteiro objetivando a preservação dos direitos da categoria. A propósito disso, as ações judiciais são impetradas especialmente quando as questões não são resolvidas por meio da negociação com a instituição ou quando as ações são oriundas de determinações externas, daí a grande demanda por estas ações judiciais nos últimos anos. Posso destacar a ações dos pagamentos dos adicionais de insalubridade e periculosidade, das progressões funcionais, de reposição ao erário, de auxílio pré-escolar, dos pagamentos de valores referentes a exercícios findos, dos pagamentos e atualizações de valores de precatórios, dentre outras.

Enfim, nossa avaliação sobre a atuação à frente da Adufal é bastante positiva. Evidentemente, se faz necessário melhorar nossa capacidade de mobilização da base docente. Esta é uma necessidade permanente porque os desafios que estão por vir ainda são muitos. Porém, disposição para a luta não nos falta! Vamos em frente!

SOBRE O AUTOR

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