MapSãoFrancisco inicia mapeamento de lagoas e várzeas no Baixo São Francisco

Por Redação, com Assessoria 18/12/2021 14h02
Por Redação, com Assessoria 18/12/2021 14h02
MapSãoFrancisco inicia mapeamento de lagoas e várzeas no Baixo São Francisco
MapSãoFrancisco inicia mapeamento de lagoas e várzeas no Baixo São Francisco - Foto: Carlos E. Ribeiro

Lançado há poucos dias, o MapSãoFrancisco não perde tempo e já está em campo com seu primeiro projeto de
mapeamento colaborativo na bacia hidrográfica do rio São Francisco, começando com a região do trecho baixo do rio.

O Mapeamento das Lagoas e Várzeas do Baixo São Francisco vai para o campo tendo como alvo as esquecidas, mas sempre existentes, lagoas e várzeas marginais que, apesar de sua capital importância (ver quadro no final da matéria), não estão representadas adequadamente ou simplesmente não constam na cartografia oficial, o que compromete a elaboração e aplicação políticas públicas regionais de cunho socioambiental.

A área de mapeamento da iniciativa tem cerca de 1.074,772 km2 e é classificada, pelo projeto, como em situação de “precariedade cartográfica”, situação que, no entanto, e ainda de acordo com o MapSãoFrancisco “é aceita pela sociedade através de seus entes do sistema de gestão da ocupação e usos do território: governos municipais, dos estados de Alagoas e Sergipe e União, o que estabeleceria a negação dos direitos do rio São Francisco, seus ecossistemas e suas populações”.

Professor do curso de Engenharia de Pesca da UFAL – Universidade Federal de Alagoas, parceira do projeto, Igor da Mata Oliveira entende que nos últimos anos, têm se observado uma perda da informação fundamental sobre as lagoas marginais do Baixo São Francisco. “Esses ambientes vêm sendo gradativamente esquecidos nos levantamentos cartográficos oficiais ao longo das últimas décadas, como se simplesmente não existissem mais. Destaca-se que as lagoas marginais são patrimônio da União, a qual atualmente desconhece completamente sua quantidade e extensão”, acrescenta Igor.

Prosseguindo, Igor percebe que “a situação é extremamente preocupante, pois a gradativa perda das informações da condição passada do rio nos impede de realizar uma avaliação dos cenários ao longo do tempo e das suas reais necessidades de manutenção. Com isso, passa-se a considerar como parâmetro uma condição mais recente e degradada, fazendo com que as metas de gestão sejam cada vez mais distantes do equilíbrio
necessário entre os diversos usos e interesses do ambiente.”

Foi para contrapor essa precária representação cartográfica e de informações que o MapSãoFrancisco, em prosseguimento à cooperação estabelecida com o HOT – Humanitarian OpenStreetMap Team e com a UFAL – Universidade Federal de Alagoas, através de seu curso de engenharia de pesca em Penedo, desenvolveu o projeto Mapeamento de Lagoas e Várzeas do Baixo São Francisco.

Mapas sem lagoas


O vazio das lagoas nos mapas oficiais é o principal desafio da empreitada, pois “é uma situação que é verificada não apenas em mapas federais mas também naqueles produzidos pelos estados de Sergipe e Alagoas, colocando em risco qualquer discussão adequada sobre o futuro do São Francisco”, afirma Carlos Eduardo, que completa expondo que “pela situação de real risco do fim do Velho Chico como um rio de fato, o MapSãoFrancisco estabeleceu o mapeamento das lagoas e várzeas com altamente prioritário, uma vez que não conhecemos ação similar por parte das gestões das águas e território da bacia hidrográfica”.

De fato, as cartografias oficiais disponíveis em sítios como os da ANA – Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico e do CBHSF – Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco tampouco têm publicados mapas específicos sobre o tema ou mesmo digitais que contenham camadas com os elementos lagoas e várzeas marginais.

Seguindo a regra, o SPU - Serviço do Patrimônio da União, que por lei é o gestor das terras de domínio da União ao longo do Velho Chico, nas quais estariam as lagoas e várzeas, também não apresenta qualquer base cartográfica pública, por mais rudimentar, de tão importante território coletivo, contribuindo para a precária gestão do mesmo(ver box ao final da matéria).

Por que mapear lagoas e várzeas no Baixo São Francisco?


O MapSãoFrancisco estabeleceu o projeto de mapeamento das lagoas e várzeas é considerado como de alta prioridade pois há que as inserir, novamente, e de forma precisa, independente das ocupações e usos atuais,
na cartografia oficial.

Esta, desde a regularização, vem gradativamente declinando da representação adequada dos corpos hídricos, ou ainda simplesmente optando pela eliminação em cartografias atualizadas. As lagoas e várzeas do rio São Francisco, integrantes de sua planície de inundação, também “são rio”, pois estariam inseridas na chamada Linha Média das Enchentes Ordinárias (LMEO), em acordo com o definido pelo SPU – Serviço do Patrimônio da União, órgão que aparentemente ignora a gravidade do problema.

Os idealizadores do projeto explicam que o mesmo pois terá como produto uma das camadas básicas da cartografia que abordará o passivo socioambiental da região após mais de quarenta anos de regularização.

A priorização destes corpos d’água está, também, vinculada à relação das lagoas no quesito segurança física e patrimonial das populações difusas e urbanas espalhadas ao longo do Baixo São Francisco.

Estará em foco amplo a questão dos usos e ocupações do território, que contará com o mapeamento de elementos produzidos pelas políticas públicas relacionadas ao que o MapSãoFrancisco entende como uma
“temerária gestão das águas do rio” por não proteger e conservar as lagoas e várzeas da forma adequada.

Em caso de cheias, as lagoas e várzeas, agindo em harmonia com o canal fluvial teriam o papel de algo como “volume de amortecimento” para receber a água, no segundo estágio do processo de transbordamento do
rio, imediatamente após o enchimento da calha principal. Até antes da regularização, com as cheias anuais, o canal fluvial era mais profundo e podia conter mais água.

Não é o caso do baixo São Francisco do presente: com a calha completamente atrofiada, assoreada, sem o já citado “volume de amortecimento”. Um evento de vazões de grande volume no presente, em um rio sem capacidade de conter a água, produziria um cenário de extrema gravidade para o qual a União, os estados de Alagoas e Sergipe e os municípios não contam com qualquer plano de emergência.

Paisagens sem herdeiros, presente sem conhecimento do passado, futuro incerto


Segundo Carlos Eduardo Ribeiro Jr., da Canoa de Tolda, uma das idealizadoras do projeto, “a grosso modo e equivocadamente, as lagoas passaram à condição de “não existência” pelo fato de não mais receberem as águas do Velho Chico, como há quarenta anos atrás no período das cheias naturais. Uma boa parte da população no Baixo, senão a maioria, nunca as viu com água, não herdou a memória de seus pais e avós, das dezenas de massas d’água ao longo das margens, cheias, produzindo vida, alimento, paisagem saudável, mantendo um pujante sistema socioeconômico vazanteiro”.

“Ainda que próximas de muitos povoados, ao alcance da vista das populações, o desconhecimento, ou a não-percepção das lagoas como lagoas, como território a ser preservado grande cuidado, perpetua um cenário que não favorece a preservação do Velho Chico pois não são conhecidas cobranças da sociedade pela urgente conservação e proteção dos importantes corpos hídricos”, conclui Carlos Eduardo.

Perspectivas


Para os idealizadores do MapSãoFrancisco é esperado que em poucos meses já se tenha bons resultados, em razão da boa velocidade com que as diversas áreas, organizadas pelo sistema disponibilizado pelo HOT, o Tasking Manager, estão sendo mapeadas, validadas e publicadas.

Desde seu lançamento operacional, há poucos dias, o projeto demonstra já conta com inúmeras pessoas  mapeadoras não só no Brasil, mas também de diversas outras partes do mundo. É uma visível convergência de
interesse colaborativo e executivo mostrando o poder dessa imensa comunidade global de mapeadores voluntários organizada pelo HOT e orientada para os inúmeros projetos listados na plataforma da organização.

O mapeamento colaborativo pela plataforma OSM – OpenStreetMap tem a característica básica de apresentar resultado imediato: ao inserir um elemento no mapa, uma vez finalizado e validado, ele passa a ser público imediatamente e disponível inclusive em bases cartográficas online de órgãos governamentais.

O elemento mapeado passa a “existir”, oficialmente, de uma vez por todas, completando seu justo e devido lugar no vazio cartográfico formal.

Estão previstas atividades de campo, tão logo seja possível, para a conferência das poligonais realizadas remotamente, diagnóstico das lagoas e coleta de depoimentos de pessoas que, há mais de quarenta anos atrás, tiveram a oportunidade de ver as lagoas cheias com as águas do São Francisco.

Como colaborar no mapeamento das lagoas e várzeas


Para participar do projeto do MapSãoFrancisco é necessário que a pessoa tenha uma conta no OSM - OpenStreetMap.

Em seguida, ela fará seu primeiro acesso na plataforma Tasking Manager do HOT que identificará sua conta/usuário.Ali serão encontradas todas as informações inclusive de vídeos de treinamento que contam com tradução instantânea para o português.

Para a seleção das áreas do projeto que poderão ser mapeadas, o acesso poderá ser feito tanto pelo MapSãoFrancisco como pelo Tasking Manager.

Todos os projetos do MapSãoFrancisco estão em português.