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Quem administrou a pandemia de COVID-19 nos Estados? Uma análise do perfil e rotatividade dos secretários estaduais de saúde

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Por Redação
Atualização:

Vitória Lopes de Oliveira Silva, Graduanda em Administração Pública na FGV-EAESP

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Iana Alves de Lima, Doutoranda em Administração Pública e Governo e Professora na FGV-EAESP

No Brasil, a gestão da saúde pública em todos os níveis da federação por si só já era um grande desafio para políticos e burocratas. Com a chegada da crise sanitária provocada pela pandemia de COVID-19 esses desafios ganharam proporções ainda maiores.

Ao longo do período de pandemia, o Ministério da Saúde foi chefiado por 4 ministros diferentes, o que demonstra certa dificuldade do executivo em escolher e manter um nome com expertise à frente do cargo durante a crise. Além disso, o governo federal apresentou desempenho aquém do esperado no que se refere à elaboração e coordenação das respostas à pandemia.

Diante do posicionamento do executivo federal, secretários(as) dos governos estaduais e municipais assumiram o protagonismo e tiveram, portanto, as suas ações de combate à pandemia reforçadas. Os Estados, em especial, foram centrais no processo de coordenação dessas respostas, com destaque para aquisição de insumos (EPIs, respiradores, oxigênio, testes rápidos etc.), gestão dos leitos de UTI (abertura de hospitais de campanha, convênios com hospitais particulares etc.) e campanhas de vacinação contra a COVID-19.

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No entanto, apesar do esforço no cumprimento dessas funções, o cenário de alta rotatividade dos nomeados para ocupar as chefias das pastas de saúde repetiu-se em nível subnacional. Esta é a conclusão do Boletim No. 40 de Covid-19: Políticas Públicas e Respostas da Sociedade, publicado pela Rede de Pesquisa Solidária[1]. A partir de um levantamento sobre as substituições de secretários de saúde dos governos estaduais durante a pandemia, o estudo analisou as 30 substituições de secretários em 14 Estados (Acre, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Minas Gerais, Pará, Rio de Janeiro, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins) ao longo dos últimos dois anos. Além disso, destaca a nova onda de exonerações até o último 2 de abril (período limite de desincompatibilização eleitoral): outros 10 secretários deixaram o cargo para concorrer às eleições deste ano.

Os dados utilizados no estudo, coletados a partir do projeto CepespData, abrangem o período de janeiro de 2020 a março de 2022. Grande parte das trocas (14) concentrou-se no primeiro semestre da pandemia. Esses meses iniciais foram marcados pela deflagração de inúmeras operações pelo Ministério Público e Polícias Federal e Civil com o objetivo de investigar suspeitas de corrupção nos Estados relacionados à gestão da pandemia, o que impactou a permanência de diversos secretários.

A maior parte das trocas aconteceu por desgaste político e denúncias por má gestão ou fraude. O desgaste político, que marca 15 das 30 exonerações, diz respeito a situações de divergência e descontentamento entre secretários e governadores. As denúncias de fraude custaram o cargo de 9 secretários, alguns culminando, inclusive, com a prisão temporária do nomeado.

Gráfico 1. Motivos para substituição de secretários estaduais de saúde, por UF, entre 01 de janeiro de 2020 e 17 de março de 2022.

 Foto: Estadão

Fonte: Rede de Pesquisa Solidária em Políticas Públicas e Sociedade, Boletim 40.

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Adicionalmente, o estudo analisou o perfil e trajetória dos nomeados. Em linhas gerais, os dados demonstraram que a maior parte dos secretários de saúde não é filiada a nenhum partido político, possui formação em saúde, especialização em gestão e/ou tem experiência na área de saúde pública.

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Outra informação trazida pelo boletim que merece atenção é que as mulheres são minoria no comando das secretarias, embora sejam a maioria na linha de frente da política de saúde. Atualmente, apenas 5 secretarias de saúde estaduais são lideradas por mulheres (Acre, Bahia, Rio Grande do Sul, Roraima e Sergipe); porém, no decorrer da pandemia esse número chegou a ser ainda menor, com apenas 2 secretárias entre os 27, no Rio Grande do Sul e em Sergipe.

A pesquisa chama a atenção não apenas da comunidade acadêmica para a necessidade de inclinar-se teórica e metodologicamente para as dinâmicas estabelecidas entre política, burocracia e funcionamento dos governos nos níveis estaduais e municipais, como também alerta os gestores públicos sobre os riscos da alta rotatividade de dirigentes públicos, bem como a falta de diversidade nos quadros. Um número elevado de substituições sem uma estratégia assertiva e transparente dos governos, e uma burocracia de alto escalão pouco representativa, pode provocar cenários de instabilidade e impactar negativamente a qualidade da entrega dos serviços públicos de saúde aos cidadãos. Em um contexto em que a complexidade dos problemas públicos exige cada vez mais das nossas lideranças, é importante estarmos atentos às dinâmicas das organizações públicas e investigar possíveis problemas estruturais que possam afetar a capacidade do setor público de responder a crises.

Nota

[1] A nota técnica foi elaborada pelas pesquisadoras Lorena Barberia (USP), Iana Alves de Lima (FGV-EAESP), Vitória Lopes (FGV-EAESP), Natália Moreira (USP), Tatiane Sousa (ENSP-Fiocruz e USP), Luciana Santana (UFAL), Ananda Marques (Escola de Saúde Pública do Maranhão) e Aryanne Alcântara (UFAL).

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