22/08/2022
Atualizada: 22/08/2022 16:47:13


Recentemente se desenvolveu o debate entre os Colegiados de Cursos da UFAL sobre a proposta de regulamentação na instituição da PORTARIA Nº 2.117, DE 6 DE DEZEMBRO DE 2019, que traz a seguinte permissão: Art. 2º As IES poderão introduzir a oferta de carga horária na modalidade de EaD na organização pedagógica e curricular de seus cursos de graduação presenciais, até o limite de 40% da carga horária total do curso.

Percebe-se que a Portaria 2.117/2019 é anterior à Pandemia de COVID19, porém o contexto da emergência e das medidas de isolamento social exigidas naquele momento, que trouxeram a vivência do ensino remoto como alternativa emergencial, acelerou a disseminação do discurso da “inexorabilidade” do uso das tecnologias da informação e comunicação na educação (TICs).

A Portaria 2.117/2019 traz uma permissão, e não uma obrigatoriedade. Logo, o primeiro questionamento a fazer é: por que a UFAL deveria regulamentar a aplicação de 40% de carga horária não presencial em seus cursos presenciais?

Não é necessário muito esforço para compreender que para as instituições privadas a adoção de tecnologias da informação é presidida pelos interesses da redução de custos e maximização de lucros, e nesta redução de custos temos a brutal precarização da profissão docente, denunciada pelas organizações sindicais. Contudo, uma instituição pública não pode seguir tais diretrizes ao adotar TICs.

As organizações dos profissionais da educação alertam para a crescente mercantilização, privatização e precarização da profissão docente, aceleradas com a introdução das TICs durante o ensino remoto na pandemia, trazendo a intensificação da jornada de trabalho, a perda de autonomia didático-pedagógica, de direitos autorais, autoritarismo e verticalização da gestão educacional.

Quanto à captura de dados, a ADUFAL tem problematizando esse tema, e na mesa de debates: Software Livre e Instituições Públicas de Educação: controle X autonomia intelectual, (https://www.youtube.com/watch?v=wbc0HCUTugc&list=PLeo7ozo4gnVd6gnQMZbP0kJ8BvtI53M5x&index=10) com os convidados Marcos Vinícius Mazoni e Haydee Svab, debateu-se esse novo formato do capitalismo de vigilância e a mercantilização do conhecimento no espaço acadêmico, onde o conhecimento é apropriado e privatizado e o controle da sociedade é ampliado por parte das grandes corporações de tecnologia.

O discurso produzido pelos interesses das grandes corporações de tecnologia e pela intervenção do modelo ultra neoliberal nas políticas educacionais busca associar as TICs com a introdução das metodologias ativas com o movimento Escola Nova, uma tendência liberal do humanismo, que trouxe o pragmatismo pedagógico, a prevalência das abordagens psicológicas na relação ensino-aprendizagem, especialmente a Epistemologia Genética, entre outros aspectos.

As tecnologias da informação, com o aperfeiçoamento da inteligência artificial, possibilitam que as concepções instrucionistas avancem, e hoje há a produção de inúmeros produtos/mercadorias que permitem sua efetivação no sistema educacional.

O neotecnicismo tem muitas ferramentas para o controle do processo ensino-aprendizagem e o esvaziamento da relação docente/discente, portanto a negação da educação como formação humana, reduzindo-a à produção de consumidores/trabalhadores moldados pelas corporações empresariais.

Assim, no espaço universitário – locus de produção de conhecimento – é inadmissível que a abordagem desse tema se dê de forma acrítica, ingênua.

Com este alerta, chamamos a atenção para que o debate sobre o tema da “mistura” das modalidades EaD e presencial deve primar por definições conceituais. Senão vejamos:

Art. 1º Para os fins deste Decreto considera-se educação a distância a modalidade educacional na qual a mediação didático pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorra com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com pessoal qualificado, com políticas de acesso, com acompanhamento e avaliação compatíveis, entre outros, e desenvolva atividades educativas por estudantes e profissionais da educação que estejam em lugares e tempos diversos. DECRETO Nº 9.057, DE 25 DE MAIO DE 2017

Neste decreto, a Educação a Distância é caracterizada como modalidade educacional, que para ser efetiva exige uma mediação didático-pedagógica diferenciada para propiciar a relação ensino-aprendizagem sem a relação tempo-espaço simultânea entre estudantes e professores/as. Na regulamentação da EaD são organizados pólos de apoio com bibliotecas, laboratórios de informática, tutorias on line e presenciais, material didático-específico para as interações daquela modalidade.

A atual orientação do Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Educação (CNE) iniciou por permitir 20% de carga horária com disciplinas não presenciais nos cursos presenciais (Portaria Nº 1.428/2016), e mais em seguida passou por permitir 40% da carga horária total do curso com atividades não presenciais nos cursos presenciais (Portaria Nº 2.117/2019) prescindindo, contudo, das condições obrigatórias para a execução da modalidade EaD. E já há um novo parecer do CNE, ainda não homologado pelo Ministro da Educação, que institui o “ensino híbrido” e vai no sentido da flexibilização da frequência do estudante e de várias normas regulamentadoras do funcionamento das instituições educacionais, o que se coaduna com os objetivos de desregulamentação pública, total privatização dos espaços públicos e destruição das noções de direitos da cidadania.

Caberia inclusive o questionamento sobre a legalidade da Portaria nº 2.117/2019, posto que vem burlar as exigências dos Decretos Nº 9.057/2017 sobre as condições adequadas para a modalidade EaD, visto que um percentual tão alto de carga horária (40%) deveria obrigar a instituição a seguir os parâmetros do citado decreto. Não é o que a portaria em questão faz, e isto vem favorecer aos interesses de minimização de custos das grandes corporações internacionais que ora detém o controle acionário das maiores IES privadas do país.

Diante do contexto de aprofundamento das políticas ultra neoliberais e os brutais cortes no financiamento da educação pública, especialmente das IFES, a adoção de medidas de minimização de custos e precarização das condições adequadas para o ensino, estão conectadas com os interesses da mercantilização e privatização das Universidades públicas, e assim não podemos analisar de forma ingênua e acrítica a regulamentação da aplicação da Portaria nº. 2.117/2019 na UFAL. 

Para além da análise do contexto político, há que se debruçar sobre a inconsistência conceitual presente na minuta em debate, pois as atividades de estudos individuais e em grupo e as atividades de estudos e preparação de trabalhos, passam a ser denominadas de carga horária não presencial. A utilização do ambiente virtual de aprendizagem na plataforma da instituição, adotada por muitos docentes, também são denominados de carga horária não presencial. E assim, metodologias e recursos do cotidiano de nossas disciplinas presenciais poderão ser considerados uma carga horária a ser “descontada” da atual carga horária presencial das disciplinas.

A atual minuta em debate autoriza várias possibilidades para reduzir a relação docente/discentes à carga horária presencial. No entanto, não responsabiliza a instituição para fornecer os recursos que mediatizam a relação não presencial. Como exemplo, temos a confusão conceitual entre a ação da Monitoria (estudantes de graduação em processo de treinamento direto por docentes para atividades de ensino) e as atribuições da Tutoria que é exercida na modalidade EaD por profissionais qualificados para a Educação Superior.

Isso enseja vários questionamentos e, considerando tudo que foi acima exposto, a ADUFAL chama o coletivo dos docentes da UFAL para refletir, questionar e problematizar não apenas a proposta de transformar 40% da carga horária de nossos cursos de graduação em carga horária não presencial, mas todo o conjunto de questões que estão implícitas neste debate, pois a própria profissão docente está em cheque no atual contexto.

A entidade também convoca a categoria docente para participar da assembleia geral, que será realizada no dia 25 de agosto, de 9h às 12h, de forma presencial no auditório Profa. Enfa. Vera Rocha, localizado no antigo prédio do Csau (Centro de Saúde), onde será discutido o presente documento durante a pauta “discussão sobre o ensino híbrido/remoto”.

 

Maceió, 22 de agosto de 2022

Associação dos Docentes da Universidade Federal de Alagoas (ADUFAL)


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