Artes

Conheça a gravurista arapiraquense que foi premiada entre os 100 melhores artistas da América Latina

Guadalupe do Nascimento Ferreira, é autodidata e faz gravuras desde 2016

Por Larissa Galvão/Sob supervisão da edição 08/01/2022 18h06
Conheça a gravurista arapiraquense que foi premiada entre os 100 melhores artistas da América Latina
Guadalupe do Nascimento Ferreira - Foto: Cortesia

A xilogravura é uma técnica de origem chinesa na qual o artesão se baseia em desenhar e entalhar uma figura em uma superfície de madeira com um auxílio de um material cortante, cobri-la de tinta e imprimir em outro local, como um tecido ou papel. É arte de ‘’gravar’’ em madeira. Tal arte requer habilidade e dessa técnica, a arapiraquense Guadalupe do Nascimento Ferreira domina.

Ela é gravurista desde 2016, autodidata, conheceu a técnica em São Paulo durante um congresso que participou durante a graduação de Ciências Sociais. Fez curso de carimbo e máquina de gravura industrial, e posteriormente se aprofundou na técnica da xilogravura e linoleogravura, pesquisando materiais que poderia utilizar para fazer os carimbos manuais e até hoje segue fazendo os seus trabalhos como artesã.

Trajetória 

Guadalupe é bacharel em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Alagoas. Na época em que fazia a graduação,precisou morar na capital Maceió. Foi bolsista, pesquisou sobre saúde e artes, trabalhou na edição do primeiro volume da Revista Mundaú, da Ufal, na área da antropologia. Fez mestrado em Antropologia e concluiu durante a pandemia, foi quando retornou para o interior, em Arapiraca. Neste período ela relatou que teve dificuldades em conseguir um emprego na área de formação, tentou trabalhos, concursos, entregou currículos em instituições em que pudesse atuar, mas não conseguiu.

"Eu fui focando na gravura não só como forma de trabalho, porque viver de arte é difícil, mas como forma de descarregar todas essas frustrações que acabam ocorrendo quando a gente através de muita luta não consegue um espaço na sua própria cidade".

Começou a fazer os carimbos com o estilete mas acabava se machucando durante o processo de fazer o molde na madeira. Durante um dos congressos em que esteve, um xilogravurista, gostou de sua arte e lhe presenteou com um estojo específico para fazer as gravuras. Guadalupe destaca que durante sua trajetória acadêmica participou de vários congressos regionais e internacionais de Antropologia onde conheceu diversos gravadores e artistas que ajudaram-na, além de trocar experiências.

Retornou para Alagoas, querendo fazer mais carimbos, mas não tinha dinheiro para comprar uma máquina, que custa em média 5 mil reais.

“Eu não tinha verba para comprar uma máquina para fazer carimbos industriais em máquina porque é muito caro, é mais de 5 mil reais. Eu sou periférica, fiz minha graduação por causa das bolsas estudantis, fiz o mestrado porque eu era financiada pelo CNPQ, eu tinha uma bolsa para poder pesquisar e estudar."

Foi a partir daí que começou a pesquisar materiais que poderiam ser utilizados e se aprofundou nas técnicas de carimbos manuais.

Exposição:

Em 2017, participou de um Congresso chamado "Desfazendo o Gênero" onde iria apresentar uma pesquisa na área de Antropologia. Ela levou os cadernos feitos a partir da xilogravura para expor e vender em uma banquinha no evento.

Começou a produzir cadernos estampados com carimbos e artes para enquadrar para vender e complementar a renda, pois a bolsa que recebia para estudar não supria todos os gastos, e desde então não parou mais.

Inspirações:


Dentre as suas inspirações para os desenhos estão todos os processos de viagens e lugares em que esteve, como os congressos, aldeias indígenas, e lugares de naturezas ‘exuberantes’.

"A natureza sempre fez parte das minhas inspirações. O mato, o Sertão, o Rio, a Praia, o Sol e a Lua. O Sertão é um dos lugares que eu mais amei e amo estar. O Rio São Francisco na parte que o Rio passa é um dos lugares mais lindos pra mim e que eu já fui. E a praia de Maceió de quando eu morava lá. Era um alívio, estudar tanto e ir pro mar aliviar as ideias".


Além das inspirações, das vivências e natureza, Guadalupe também destacou que a mãe também é artista e artesã e faz crochê e doces artesanais.

"Ela faz uns doces caseiros artesanais que são herança da nossa família, da linhagem da minha avó e faz crochê, então eu já tenho na minha família e na minha linhagem a arte"

Orixás


A artesã ainda destacou que os orixás fazem parte do seu fazer artístico:

"Me inspiram e estão sempre comigo. Apesar de eu não ser iniciada em nenhuma religião, eu acredito que os orixás, Deus e tudo que é sagrado estão sempre me ajudando a produzir e a melhorar cada vez mais minhas técnicas.

Xilogravura de Oxum: Oxum é uma orixá, rainha da água doce, dona dos rios e cachoeiras, cultuada nas religiões de matrizes africanas do candomblé e na umbanda

Arte e Técnica


A artista faz xilogravuras, linoleogravuras e carimbos. São materiais diferentes, mas que utilizam a mesma técnica.

A técnica consiste em escavar uma matriz com estilete. Pega-se uma madeira, ou uma borracha, por exemplo, faz um desenho e vai escavando o desenho. A partir da escavação, o desenho vai se formando, e é preparada a tinta no vidro, passa o rolinho especial para a gravura (que tem que ser de borracha) na tinta (que também precisa ser especial), a partir daí passa a tinta na matriz escavada que se tornou um desenho a partir do corte que foi dado, e depois de passar o rolinho em cima da matriz é colocada a folha e imprime com uma colher de pau esfregando a folha em cima da matriz até sair o desenho na colher de pau.


As gravuras são feitas como um carimbo escavando a matriz com um estilete, forma o desenho, e a partir do desenho carimba um papel ou o que quiser.

Em média, pode demorar uma semana ou um mês para terminar o trabalho, dependendo principalmente do tamanho da gravura.

Guadalupe afirma que a arte mudou a sua vida em todos os sentidos, não somente por fazê-la, mas também por pesquisar arte. Ela destacou que quando morava em Maceió, durante a graduação, pesquisava um grupo de artistas, e se aproximou do teatro, da performance corporal, e tudo isso fez com que fizesse amigos, se aproximou do fazer artístico,do encantamento pela arte e que isto acabou levando-a para a gravura e produção.

"Além de pesquisar e escrever sobre arte, a arte me levou para fabricar a arte com as mãos. Ela me tira de momentos complicados e me leva para os meus sonhos. Quando eu faço uma gravura eu esqueço de todos os problemas, e com ela eu viajo para mundos melhores".

Prêmio


Premiada, no ano passado, ela foi selecionada entre as 100 melhores artistas da América Latina, no prêmio Latinidades Pretas, com a obra de cordel intitulada 'Zini', que traz também as gravuras.

Confira: https://www.latinidadespretas....

Vendas:

Por não ter um ateliê físico, ela expõe todas as artes e realiza as vendas através do perfil do Instagram.

Ela destaca que já vendeu e realizou entregas para o estado do Rio de Janeiro, mas que grande parte dos seus clientes são de Maceió.

"Com essa pandemia, eu comecei a produzir muito mais. Fazendo quadros maiores. Parei um pouco mais com os cadernos que eu fazia e agora estou produzindo quadros para decoração de ambientes".

Para quem quiser conhecer detalhadamente as obras e parte do processo de produção é só acessar o perfil:
https://instagram.com/lokaduca...

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