Há poucas semanas, líderes globais engajados com o combate ao aquecimento global se reuniram em Portugal para discutir como preservar e restaurar os oceanos, reverter a perda de biodiversidade, a poluição plástica, química e orgânica e o processo de acidificação. Na ocasião, foram divulgados dados preocupantes: as ações humanas já alteraram 66% do meio ambiente marinho. Além disso, mais de um terço dos estoques pesqueiros estão sendo explorados além de sua capacidade de regeneração. O impacto no mar atinge populações inteiras: pelo menos três bilhões de pessoas no mundo dependem dos recursos do mar como sua fonte principal de proteínas e acredita-se que metade do oxigênio que os seres humanos respiram vêm dos oceanos.
No Brasil, o aumento da temperatura dos oceanos também tem impactado a vida marinha. Um estudo de pesquisadores do Peld Costa dos Corais Alagoas e Projeto Conservação Recifal (PCR) constatou alta mortalidade de corais em Alagoas, na região Nordeste. Em algumas espécies, o total de mortes chega a ser superior a 50%. As causas estão relacionadas ao aumento da temperatura dos oceanos ligado aos efeitos do aquecimento global, de acordo com a pesquisa, que foi publicada no fim de maio na revista acadêmica Frontiers in Marine Science.
O levantamento foi realizado por Pedro Pereira, coordenador do Projeto Conservação Recifal e membro do Peld Costa dos Corais Alagoas, e pesquisadores ligados à Universidade Federal de Alagoas (UFAL), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Três espécies em especial foram afetadas: millepora braziliensis, millepora alcicornis (corais de fogo) e mussismilia harttii (coral cérebro). A mortalidade da primeira espécie chegou a 100%, enquanto que os corais de fogo tiveram mortalidade de até 55% e o coral cérebro com mortalidade de 27%. As espécies de corais são relevantes para o equilíbrio do ambiente, pois servem como habitats para peixes e constroem recifes.
Em maio de 2020, o estresse dos corais na APA chegou a 12, o maior acúmulo por calor da série histórica, que começou em 1985. Valores acima de 4 na unidade de medida degree heating week (DHW) causam o branqueamento de 30% a 40% dos corais. O branqueamento, por si só, não causa a morte dos corais como efeito imediato, segundo os pesquisadores, mas indica mudanças na temperatura de mares e oceanos. Boa parte não sobreviveram.
Os pesquisadores acreditam que o derramamento de óleo no litoral do Nordeste, vindo de um petroleiro grego em 2019, também pode ter contribuído para a situação atual. Uma das regiões mais afetadas foi a Área de Preservação Ambiental (APA) Costa dos Corais, entre o litoral sul de Pernambuco e o litoral norte de Alagoas.
Além disso, de acordo com Thauan Santos, professor doutor da Escola de Guerra Naval (EGN) e coordenador do grupo de pesquisa Economia do Mar (GEM), que estuda o tema no Brasil, um tipo de bioinvasor, coral-sol, começou a ser percebido em áreas do litoral Sul de Alagoas. Anteriormente, a espécie havia sido identificada no Ceará e em Pernambuco. “Ele é uma grande ameaça dada sua alta capacidade reprodutiva, pressionando a vida marinha onde se encontra”, afirma.
Os corais são peças importantes para as atividades econômicas de diversas regiões. De acordo com um relatório da consultoria e auditoria Deloitte, a Grande Barreira de Corais, maior barreira do mundo, localizada na Austrália, possui um valor econômico, social e financeiro estimado em US$ 56 bilhões, além de manter 64 mil empregos e contribuir para US$ 6,4 bilhões para a economia australiana em 2016. Somente na Austrália, são gerados 39 mil empregos diretos em setores como aviação, telecomunicações, óleo e gás, públicos e varejo.
Em termos ambientais, a conta que a consultoria fez é de que 3 mil corais oferecem um ano inteiro de comida e abrigo para outras espécies, que 1,7 mil espécies de peixes e outros animais aquáticos vivem a identificam como lar e que 14 ecossistemas costais são importantes para sua preservação.