"O lar não é seguro para muitas mulheres", afirma especialista

23/07/2022 08:01 - Especiais
Por Redação
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Alagoas registrou pelo menos três casos de feminicídio em apenas oito dias, onde as vítimas foram assassinadas por companheiros com quem mantinham um casamento. Dos crimes registrados, dois aconteceram na capital Maceió e outro foi registrado em Arapiraca, no Agreste alagoano.

A diretora e professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e coordenadora do grupo de pesquisa CARMIM Feminismo Jurídico, Elaine Pimentel, é a entrevistada do CadaMinuto neste sábado (23) e explicou a urgência de abordar o tema e lutar contra a violência de gênero através da informação e debates. Segundo ela, é fundamental comunicar e denunciar os casos de violência contra a mulher.

Confira a entrevista abaixo:

CM: Tivemos três casos de feminicídios em Alagoas em uma semana. Na sua opinião, por qual motivo estamos vivendo isso?

EP: Não encontramos conexões com os casos, apesar de terem sido praticados essa semana. Eles mostram o sintoma de uma realidade, em que a violência doméstica de gênero ceifa a vida de mulheres no contexto das relações conjugais. Então significa que a gente precisa falar mais sobre isso porque para muitas mulheres o lar não é um lugar seguro. Estar ao lado do seu companheiro não é um lugar seguro!

CM: Você acredita que o Poder Público tem deixado de lado as políticas públicas para as mulheres? Explique.

EP: Essa questão do minimizar nós não vamos ter uma receita pronta, não é da noite para o dia. A gente já tem uma sociedade marcada pelas desigualdades e violências de gênero estruturalmente e nas relações pessoais. O enfrentamento à violência é um trabalho árduo e cujo resultado demanda tempo, mas é preciso falar sobre isso, ocupar os espaços, falar nos espaços de ensino para crianças e adultos, nos espaços de trabalho, nas empresas e nas repartições públicas. É extremamente importante que isso seja debatido em todos os lugares e que essa rede seja fortalecida, para que mulheres em situação de violência busquem ajuda. É necessário estruturar a rede para romper o silêncio.

CM: O que pode ser feito para minimizar esses casos de violência contra mulher?

EP: Eu penso que sobre políticas públicas nós temos algumas muito importantes e interessantes, mas há uma dificuldade muito grande de comunicação entre elas. Nós temos iniciativas como as delegacias especializadas na Polícia Civil , a Patrulha Maria da Penha, Nápoles, Defensoria Pública especializada, a atuação do Ministério Público, a sala do poder judiciário, mas há uma dificuldade de articulação e trabalho efetivamente em rede. Muitas mulheres não sabem a quem recorrer quando precisam de ajuda e o exemplo maior disso é o protocolo de atendimento a mulheres em situação de violência, que foi criado para orientar como proceder na Polícia Civil, na Polícia Militar, no Corpo de Bombeiros. Esse protocolo é pouquíssimo conhecido, inclusive dentro das instituições, isso revela sobretudo a fragilidade da comunicação dessa rede. O próprio protocolo não está sendo cumprido. Isso é um absurdo!

CM: A falta de delegacias para mulheres em Alagoas funcionando nos finais de semana contribui para o aumento de casos de violência, visto que as mulheres não vão denunciar e os casos de agressões acontecem mais nos finais de semana?

EP: Comunicar, denunciar imediatamente os casos de violência é fundamental. Sobretudo quando são situações em flagrante que a mulher está sob risco de morte e tudo mais. Normalmente o ciclo da violência acontece aos poucos, primeiro tem a fase do amor, da paixão, depois começam os primeiros desentendimentos, as violências que vão aumentando. Quando a situação já está mais grave, já são muitos anos de convivência com esse companheiro violento, com violência psicológica, violência moral e de toda a natureza, mas ele pode nunca ter batido. Por isso é muito importante que haja essa orientação para que as mulheres descubram se estão em situação de violência e a partir disso possam buscar ajuda. Eu ressalto aqui a importância da Patrulha Maria da Penha que em Alagoas, que além de fazer todo o acompanhamento das mulheres agredidas, vítimas, também faz o acompanhamento dos agressores. Um trabalho importante de diálogo, debate e conscientização.

CM: Qual a importância de denunciar de forma imediata os casos de violência?

EP: Acho que o protocolo atende isso muito bem, mas é preciso que esse protocolo seja conhecido. E aí não fica tudo centralizado na central de flagrantes nem nas duas delegacias especializadas que não funcionam fim de semana, que é quando os casos de violência doméstica aumentam. As mulheres ficam desassistidas porque elas efetivamente não sabem a quem recorrer e às vezes não tem como fazer, não tem como sair de casa. É preciso uma estrutura que favoreça essa comunicação com as mulheres.

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