Empresa inicia exploração de petróleo na Foz do São Francisco; 15 municípios alagoanos poderão ser afetados

13/03/2022 07:50 - Municípios
Por Maria Luiza Lúcio*
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Um projeto de exploração de petróleo, na Bacia de Sergipe e Alagoas, Foz do Rio São Francisco, iniciou sua execução após receber autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no mês passado. A proposta já foi alvo de ação do Ministério Público Federal (MPF), pela ausência de diálogo com povos ribeirinhos e tradicionais da região. Em Alagoas, 15 municípios podem ser afetados pela extração.

O chamado Projeto SEAL, da multinacional Exxon Mobil, pretende perfurar 11 poços próximos a foz e região costeira dos estados, aproximadamente a 42 km da área de pesca do camarão, um dos bancos de extração mais importantes do Brasil. Ao Cada Minuto, o professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e Pós-Doutor em Ciências Aquáticas, Emerson Soares, disse que a exploração pode trazer inúmeros prejuízos de curto a longo prazo.

Crédito da foto: Cedido

Ele afirma que modelagens feitas pela empresa, no relatório de impacto ambiental, tem falhas. “Foi construído sem levar em conta aspectos como acúmulo de metais pesados, vazões atuais do rio, atividades de exploração pesqueiras, entre outros”.

Segundo o professor, caso haja vazamento de petróleo, a depender da época do ano, correntes e extensão do desastre, poderão ser afetados o turismo, a pesca artesanal, áreas de pesca e o manguezal, que ajuda na retenção de poluentes, serve de área de alimento, habitat e são ambientes e berçários importantes para reprodução de muitas espécies de peixes costeiras.

Em Alagoas, há 15 municípios localizados na área de influência e sujeitos aos impactos potenciais da exploração de petróleo do Projeto SEAL. São eles: Barra de Santo Antônio, Barra de São Miguel, Coruripe, Feliz Deserto, Japaratinga, Jequiá da Praia, Maceió, Maragogi, Marechal Deodoro, Paripueira, Passo de Camaragibe, Piaçabuçu, Porto de Pedras, Roteiro e São Miguel dos Milagres.

Emerson critica o processo como foi construído o projeto, que reduziu a participação popular, como as comunidades tradicionais, pescadores, marisqueiros, quilombolas, entre outros atores que atuam na região. “Mesmo as audiências, estas em época de Covid-19 pela internet, não contemplaram todo público e o processo ficou prejudicado”.

“O diálogo é importante porque ajuda no entendimento, esclarece dúvidas, resolve conflitos. Melhora o entendimento sobre termos técnicos, que muitas vezes possuem linguagem não acessível a uma parte da população. Deixa mais claro os propósitos da exploração até para contar com ajuda da população, gerar renda e não prejudicar as atividades das comunidades”, completa.

Projeto pode impactar ecossistema e áreas de pesca

Para o professor, alguns impactos podem ser imediatos sobre o ecossistema e a biodiversidade. Já outros serão a médio prazo, como perturbação dos animais em época de reprodução, interferência nos sistemas de eco localização de mamíferos marinhos e em tartarugas marinhas. Ou, no caso de possível derramamento de petróleo, os danos serão imediatos e poderão durar anos.

A área pesqueira também poderá ser afetada com a diminuição de organismos, devido a perturbação e movimentação na área, que influencia na distribuição deles. “Com o aumento do fluxo de embarcações, ruídos provocados pelas sondas, aumento do perigo de choques entre embarcações de grande porte envolvidas com a empresa, com embarcações da pesca artesanal e seus apetrechos”.

Sobre o diálogo da empresa com povos ribeirinhos e tradicionais da região, Emerson acredita que foi falho e rápido. “Devido a pandemia de Covid, prejudicou bastante o acesso às informações, as próprias prefeituras da região não ajudaram muito. O diálogo poderia ter sido melhor, mais participativo e lento. Muita gente não tinha nem acesso para acompanhar as audiências ou reuniões”.

MPF questiona falta de diálogo com povos da região

Durante o processo de liberação do projeto pelo Ibama, em setembro de 2021, o órgão realizou uma audiência pública sobre o licenciamento ambiental do projeto de perfuração marítima de poços na região. O Ministério Público Federal (MPF), através da Procuradoria Da República No Estado De Alagoas, emitiu uma ação com o objetivo de anular a audiência.

De acordo com o Ministério, “houve prejuízo ao direito de participação das comunidades tradicionais pesqueiras de Alagoas, situadas na área de influência do empreendimento, em razão da dificuldade de acesso tecnológico, de mídia e de conexão à internet desses povos”, diz trecho do ofício.

A Procuradoria solicita, ainda, que o Ibama realize audiências públicas de forma presencial no estado para expor aos interessados o conteúdo do empreendimento, esclarecendo dúvidas e recolhendo dos presentes as críticas e sugestões a respeito.

Controvérsias

Uma das maiores críticas feitas ao projeto está no histórico da ExxonMobil. Em 1989, a empresa foi responsável por um dos maiores vazamentos da história, quando o petroleiro Exxon Valdez despejou 42 mil toneladas de petróleo no Alasca. O episódio ficou conhecido como “maré negra”.

Além disso, entre os meses de outubro e novembro do ano passado, a multinacional realizou, em diversos municípios da região da foz do São Francisco, treinamentos com pessoas das comunidades sobre eventuais derramamentos de óleo.

Em Piaçabuçu, no Litoral Sul de Alagoas, a prefeitura emitiu um  comunicado oficial, informando à população sobre a montagem de uma estrutura, ao lado da sede da administração pública, para um “treinamento prático para a proteção da costa no município, com a finalidade de introduzir conteúdo sobre proteção da costa e ecossistemas sensíveis capacitando membros da comunidade”.

No entanto, ao InfoSãoFrancisco, o Instituto informou que não autorizou treinamentos sobre derramamento de petróleo na região. Procurado pela reportagem, o Ibama não respondeu como está ocorrendo a fiscalização do projeto ou quais as etapas programadas. Já a Exxon Mobil informou apenas que começou a perfuração do poço Cutthroat em 20 de fevereiro e o trabalho deve levar entre 2 e 4 meses para ser concluído.

*Estagiária sob a supervisão da Editoria 

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