Agenda

Bolsonaro acena para base em pautas prioritárias no Congresso

Em busca da reeleição, o presidente da República retoma propostas da agenda de costumes. Governo federal está focado em especial na economia e na segurança pública

Por Gabriel Ferreira Borges
Publicado em 21 de março de 2022 | 05:00
 
 
 
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Em busca da reeleição, o presidente Jair Bolsonaro (PL) faz um aceno à base eleitoral a partir da agenda legislativa avaliada como prioritária pelo Planalto para 2022. Das 45 propostas enumeradas pelo Ministério da Casa Civil, nove são relacionadas à pauta de segurança e defesa, e cinco ao programa econômico. Mas os eixos temáticos são atravessados por propostas da já conhecida agenda de costumes, cara ao eleitorado mais fiel a Bolsonaro desde a campanha de 2018.

Conforme a cientista política Luciana Santana, a agenda legislativa prioritária do governo federal está focada, principalmente, em dois eixos. O primeiro é o econômico. “A gente vê muitas propostas no sentido de garantir recursos que vão dar viabilidade eleitoral, assegurando, do ponto de vista econômico, algum tipo de visibilidade para o governo Bolsonaro”, avalia a professora da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). 

Luciana aponta, por exemplo, a proposta responsável por aumentar a faixa de isenção do Imposto de Renda, assim como a de redução temporária de impostos sobre o diesel, que ainda está em formulação no Congresso. 
Já o segundo diz respeito às pautas da agenda de segurança e defesa, que “dialogam muito com o eleitorado da base bolsonarista mais ideológica”.

“São projetos que vêm sendo apresentados – ou pelo menos divulgados – por Bolsonaro como importantes para ele ou para a base, mas que, até hoje, não conseguiram espaço privilegiado para avançar”, pontua Luciana. 
A professora, também pesquisadora do Centro de Estudos Legislativos da UFMG, lembra, por exemplo, a proposta para alterar o Estatuto do Desarmamento e regularizar o exercício das atividades de colecionadores, atiradores esportivos e caçadores (CACs).

Além da flexibilização da posse e do porte de armas, o cientista político Thiago Silame aponta outras propostas caras à base bolsonarista presentes na agenda legislativa prioritária, como a proibição da saída temporária de detentos, a extinção do auxílio-reclusão para os familiares de custodiados e a diminuição da maioridade penal.

“No geral, a pauta da segurança e da defesa é muito mais moral e, portanto, ideológica, do que uma pauta voltada diretamente para a melhoria dos indicadores de segurança pública, a meu ver”, avalia o professor da Universidade Federal de Alfenas (Unifal).

À parte a agenda de segurança e defesa, Silame lembra a proposta de educação domiciliar, ou seja, homeschooling, que delegaria às famílias a educação escolar das crianças. 

“Quando temos uma proposta para discutir que as famílias sejam responsáveis pela educação de suas crianças, e elas, então, fornecerão o conteúdo que será ministrado para as crianças, desconsideramos toda a base curricular que existe, que prevê, por exemplo, a discussão transversal da questão da sexualidade”, explica o também pesquisador do Centro de Estudos Legislativos da UFMG.

Thiago Silame, da Unifal, acrescenta que a agenda legislativa funciona como uma espécie de balão de ensaio para observar o humor do Congresso. “No limite, ele (Bolsonaro) pode dizer que as pautas estão lá e, se não forem votadas, é por culpa do Congresso.

Eleições tornam ano legislativo mais curto e dificultam agenda

O ano eleitoral impõe particularidades à dinâmica da Câmara dos Deputados e do Senado. A pauta legislativa deve caminhar apenas no primeiro semestre, já que, no segundo, os parlamentares estarão em campanha. “É um ano curto do ponto de vista de atividades legislativas, e, ao mesmo tempo, o presidente é candidato à reeleição. (...) Então ele tem até meados deste ano para tentar emplacar alguma coisa dessa agenda prioritária”, ressalta Luciana Santana.

Já Thiago Silame pondera que há matérias naturalmente difíceis de serem aprovadas, sobretudo por serem Propostas de Emenda à Constituição (PECs). “O próprio auxílio-reclusão é uma PEC, então isso requer aprovação em dois turnos, nas duas Casas, com maioria qualificada”, pontua. Além disso, Silame diz que determinadas proposições, como a de mineração em terras indígenas, podem ter a constitucionalidade questionada junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) caso sejam aprovadas.

De acordo com Luciana, o “timing” mais apropriado para o governo aprovar pautas impopulares seria o primeiro ou o segundo ano de mandato. “Quanto mais próximo de nova eleição, mais difícil você tem adesão (de deputados), justamente porque tira voto. Você está muito exposto, muito próximo de um evento eleitoral, e isso pode prejudicar, sim, e ser utilizado de forma muito incisiva pelos opositores e, enfim, culminar em uma derrota eleitoral”, avalia a professora. 

Ela acrescenta que o cálculo é mais complexo após o fim das coligações proporcionais. “Vai ser muito difícil para os parlamentares se reeleger, já que não vão ter mais a possibilidade de ter uma coligação para dar suporte para vencer”.

Ideologia esteve em evidência em 2019

Questionada se as agendas legislativas prioritárias anteriores tinham o mesmo tom, Luciana Santana afirma que a apresentação de pautas ideológicas fora mais evidente em 2019. Entre 2020 e 2021, pondera, a agenda moral não foi tão privilegiada em razão da pandemia de Covid-19.

“Só não avançou porque, no início do mandato, em 2019, o Bolsonaro não tinha base parlamentar suficiente para levar nada adiante. E todas as proposições via decreto que ele apresentou acabaram caducando, e nenhuma conseguiu avançar”, pontua a professora da Ufal.</CW>

A cientista política analisa que Bolsonaro, diante dos planos para a reeleição, precisa voltar a acenar para o eleitorado que perdeu desde 2018. “Boa parte do eleitorado perdido considera que ele (Bolsonaro) realmente traiu as expectativas. Ele não avançou no que falou que iria avançar na área econômica, em pautas mais ideológicas e em pautas anticorrupção. Então, de alguma maneira, ele tenta por meio desses projetos mais conservadores resgatar parte desse eleitorado”, considera.

Thiago Silame avalia que, desde o primeiro dia, o presidente governa para a base, ou seja, está sempre em campanha, o que, ele acrescenta, é classificado nas ciências políticas como governo-movimento. “Ele precisa sempre estar ali, agitando os seus seguidores, os seus correligionários, aquelas pessoas que se vinculam a ele de maneira mais ideológica”, explica. 

 

 

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