Por Roberta Batista, g1 AL


Pesquisador brasileiro, filhos, esposa e sogra foram barrados e deportados do México — Foto: Arquivo pessoal

O sonho do pós-doutorado no México se transformou no pior pesadelo do professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Diego de Oliveira Souza e a família. O pesquisador, os dois filhos pequenos, a esposa e a sogra dele foram barrados na imigração do Aeroporto Internacional da Cidade do México, acusados de portar vistos falsos. Após ficarem separados por horas, eles foram deportados.

O g1 conversou com o pesquisador nesta segunda-feira (30). Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o professor da Ufal/Campus Arapiraca e a colega pesquisadora Paula, também financiada pelo CNPq, se programaram para fazer pós-doutorado no México e levarem suas famílias. Ele conta que os vistos foram emitidos pelo Consulado do México, no dia 23 de janeiro.

"Viemos ao Consulado Mexicano, no Rio de Janeiro, no dia 23 de janeiro fazer a entrevista, conforme agendamento, realizada com o governo mexicano via internet. Apresentamos toda a documentação e tivemos nosso visto emitido no dia 23, assim como a minha colega pesquisadora junto com a família teve o visto emitido no mesmo dia. Fizemos tudo juntos e viajamos juntos para o México no dia 27", relatou o professor Diego.

Em nota ao g1, o Consulado do México no Brasil não respondeu à alegação dada ao pesquisador de que teria apresentado visto falso. Informou apenas que "as autoridades migratórias são responsáveis para permitir ou negar o ingresso dos estrangeiros no México" e que "a apresentação do visto não garante a entrada ao território nacional. A entrada ao México está condicionada a aprovação das autoridades sanitárias e migratórias no ponto de entrada".

A reportagem também entrou em contato via e-mail com o Ministério das Relações Exteriores e foi informada de que o Itamaraty "tem conhecimento do caso e está em contato com familiares do brasileiro, bem como com o governo mexicano".

Pesquisadores brasileiros viajaram para pós-doutorado no México e levaram famílias — Foto: Arquivo pessoal

A primeira atividade da parceria internacional com a Universidad Autónoma de la Ciudad de México seria ministrar um curso no México, mas o pesadelo começou no aeroporto. A pesquisadora e os familiares foram autorizados a entrar no país com os vistos emitidos no Brasil, mas o professor Diego e os parentes foram barrados no aeroporto, mesmo com os vistos emitidos pelo mesmo Consulado.

"Nós fomos barrados na imigração, acusados de portar o visto falso. Tivemos nossos passaportes recolhidos, não só os passaportes, todos nossos pertences, inclusive celular. Minha família foi detida, separada de mim. Eu fui detido em outro setor só com homens. Disseram que tinha separação por gênero, mas a minha esposa relata que lá onde ela ficou tinha homens. Então não se sustenta", contou.

O professor relata que sequer teve chance de ser ouvido pelas autoridades mexicanas e não recebeu nenhuma explicação sobre a situação.

"Tiraram tudo meu, inclusive cadarço de tênis. Até o cadarço dos tênis eles fizeram eu retirar. Eu fiquei lá isolado, incomunicável, nem direito a ligação eu tive. Eu explicava a todo momento que era um pesquisador a serviço do governo brasileiro, que tinha um convite da universidade mexicana, que estava com a documentação. Eles nem me ouviam e nem explicavam o que estava acontecendo comigo, nem o que iria acontecer, apenas que o meu visto era falso", relatou.

Após horas separados, o pesquisador e a família se reencontraram no avião em que foram colocados de volta ao Rio de Janeiro, local de onde partiram no dia 27 de janeiro.

"Isso tudo depois de uma viagem bem cansativa. Foram 14 horas ao todo. Eu já estava sem dormir da noite interior. Aí fui deixado lá por mais de 10 horas. Claro, sem dormir. Só então quando foi às 4h da manhã me chamam e aí me levaram direto para o avião junto com a minha família. Aí os reencontrei. Devolveram o meu celular. Não devolveram os passaportes. Os passaportes eu só recebi no Brasil".

O avião fez uma parada em Bogotá, na Colômbia. No aeroporto, as humilhações continuaram. O pesquisador viu os filhos chorarem de fome e dormirem no chão.

"E aí a gente é mandado de volta via Bogotá. Paramos em Bogotá. Lá também não foi fácil porque ficamos 12 horas esperando um voo isolados em uma sala lá de desembarque desativada. Acompanhados sempre por seguranças colombianos, que eram mais cordiais que a polícia migratória do México, mas que de toda forma a gente não tinha liberdade. Podia comprar comida e água com o meu dinheiro desde que eles me acompanhassem. Teve uma hora que os meus filhos choraram com fome e naquele momento eu não tinha nenhum segurança para me acompanhar e eu vi meus filhos chorando com fome sem poder fazer nada".

O professor Diego e a família chegaram ao Rio de Janeiro no domingo (29) e vão retornar a Alagoas.

"Foi uma frustração de expectativas. Prejuízo acadêmico. Prejuízo financeiro. Danos emocionais. Só pensava nos meus filhos, minha esposa, minha sogra. Minha prioridade agora é levá-los para casa em segurança", afirmou. .

Traumatizados, os dois pesquisadores brasileiros vão abandonar o pós-doutorado no México.

"Não pretende voltar lá ao México. Vou abandonar o pós-doutorado e tentar dialogar com o CNPq, que investiu dinheiro público em mim. Explicar a situação e ver o que pode ser feito para suspender a atividade. Minha colega está lá no México, mas vai abandonar também o pós-doutorado porque ela afirma não ter condições psicológicas de seguir. Minha colega está lá com a família dela, mas está tentando voltar imediatamente para o Brasil e também vai abandonar a atividade, porque foi uma experiência muito traumática para eles também", afirmou.

Diversas instituições científicas e colegas se solidarizaram com o pesquisador (veja nota ao final do texto).

"Tenho recebido apoio. A Universidad Autónoma de la Ciudad de México foi a primeira a se manifestar. Emitiu uma carta pública de denúncia. Disse que vai acionar a Justiça mexicana. A Ufal entrou em contato comigo. Disse que vai pedir reuniões com a embaixada mexicana. Vai fazer denúncias também. Falar com o Itamaraty. Outras instituições científicas, colegas. Eu tenho recebido muito apoio, que tem sido muito importante para seguir em frente".

Filhos e sogra de pesquisador brasileiro dormindo no chão de aeroporto após serem deportados do México — Foto: Arquivo pessoal

UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS - CAMPUS ARAPIRACA

CURSO DE ENFERMAGEM

NOTA PÚBLICA

O Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas/Campus Arapiraca vem a público se solidarizar com o prof. Dr. Diego de Oliveira Souza e família, pesquisador que, no gozo de férias, viajou ao México para dar início a atividades de Estágio pós-doutoral na Universidad Autónoma de la Ciudad de México (UACM), com financiamento do CNPq, e teve sua entrada no país negada, sem direito à apresentação da documentação que comprovaria o motivo da viagem, tendo sido afastado dos familiares e submetido a constrangimentos incabíveis, uma vez que todos estavam de posse de passaportes válidos e emitidos pela Polícia Federal em Alagoas e com vistos para entrada no México, obtidos no serviço consular do Rio de Janeiro, em 23 de janeiro de 2023.

Em tempo, agradecemos ao apoio dos docentes/pesquisadores da UACM e da Reitoria da UFAL, e aguardamos as medidas cabíveis por parte das autoridades brasileiras e mexicanas, face aos danos físicos, psicológicos e financeiros decorrentes desse impedimento.

O Curso de Enfermagem da Universidade Federal de Alagoas/Campus Arapiraca continua a disposição do prof. Dr. Diego de Oliveira Souza e família e manifesta, com veemente indignação, a sua perplexidade diante dos lamentáveis fatos ocorridos.

Arapiraca/AL, 28 de janeiro de 2023

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